"Nabucco" no Theatro Municipal do RJ
Não entendo nada de futebol.
Mas um amigo meu, profundo conhecedor da matéria – capaz de proezas como citar de cor os quadros inteiros do Corinthians e do Palmeiras que disputaram a final do campeonato paulista de 1954 –, quando discorre sobre o assunto, vai desfiando, enquanto a conversa se desenrola, uma série de sábias máximas de sua própria lavra. Numa delas, afirma que mesmo que dois times voltem a se enfrentar com os mesmos jogadores de antes, nenhum jogo é, jamais, igual ao outro.
A constatação do amigo ludopedista serve também à ópera. Numa produção, mesmo que não troquemos nenhum cantor, não há uma récita igual à outra. No sábado dia 23, os cantores que se apresentaram no palco do Theatro Municipal do Rio de Janeiro ganharam o jogo de goleada. Sorte de quem – como eu e um bando de irrequietos entusiastas paulistas espalhados entre o público que lotava a casa – estava lá nessa noite histórica em que tudo deu certo. A récita foi tão perfeita que teve direito até a pedido de bis, atendido com prazer, do famoso Va’ Pensiero, que o coro interpretou como se deve, revestido de uma tristeza sublime.
No pódio, Silvio Viegas imprimiu, à sua regência, ritmo e pulsação vivos às notas que Verdi escreveu na partitura. Extraiu da massa orquestral gloriosas sonoridades, sem permitir, entretanto, que a orquestra nem por um momento cobrisse os cantores, que tratou de deixar bem confortáveis. Coisa de quem conhece ópera, de regente especializado no assunto.
Como tantas outras óperas de Rossini, Bellini e Donizetti, nas quais a grande preocupação dos artistas é contornar as dificuldades de canto, Nabucco não foi concebida para um grau de movimentação cênica que é fundamental, por exemplo, nas óperas de Puccini. André Heller-Lopes, estudioso, conhecedor da história da ópera e das tradições específicas de cada um de seus períodos, criou soluções inteligentes que modernizaram essas tradições sem desrespeitá-las.
Optando por momentos semiestáticos em vez de uma enorme coreografia, Heller-Lopes criou para seus artistas uma série de movimentos sutis, sempre guiados pelas notas emanadas da partitura orquestral, permitindo que eles não se descuidassem da produção vocal. Distribuiu seus cantores espaçadamente pela amplitude do palco, além de explorar muito bem sua disposição no sentido vertical em episódios específicos, locando os protagonistas nas várias alturas que o cenário inteligente lhe permitiu.
Assim, durante seu momento de glória como regente do reino, Abigaille se senta num trono situado no alto de uma escadaria; Nabucco, quando resolve declarar-se divino, o faz no alto de uma plataforma no extremo superior do palco. Cenários funcionais, leves e fáceis de movimentar tiveram, no entanto certas sutilezas intelectuais. Nada mais adequado do que usar inúmeros microelementos de perfil circular para representar as paredes do Templo de Jerusalém, no primeiro ato, como uma biblioteca de rolos sagrados, já que as sinagogas em geral são tanto casas de oração como congregações de estudos dos textos sagrados. Para reutilizar as paredes nos atos seguintes na Babilônia, bastou mudar sua posição e banhá-los com luz adequada, quando um sutil jogo de cores distribuídas pelos círculos passou a desenhar ícones e símbolos assírios.
O luxo, essa produção reservou mesmo foi para a escolha das vozes. Não é todo dia em que se vê, num papel comprimário como o do Grande Sacerdote de Belo, uma presença como a do excelente e experiente baixo paulista Carlos Eduardo Marcos, que, com sua voz esplêndida, profunda e penetrante, conferiu muito valor a esse personagem cuja participação não ultrapassa poucas linhas de recitativo.
De todas as óperas de Verdi, apenas Nabucco e Macbeth não dão ao tenor um dos papéis principais. E enquanto na segunda, o tenor tem ao menos uma ária de importância, na primeira o pobre Ismaele não tem uma verdadeira oportunidade de exibir seus dotes tenorís. Isso, entretanto, não representou problema para Eric Herrero, que interpretou sua parte como se fosse a mais importante da ópera. Criou, nesta que foi sua estreia no papel, um Ismaele de excepcional qualidade. Desde sua apresentação em Le Villi (2008) no TMSP, a voz de Herrero escureceu um pouco, crescendo ao mesmo tempo em volume e extensão, e corre com facilidade pela sala. Na noite de sábado, somando a esses atributos a beleza de seu timbre de tenor lírico, tipicamente italiano, ele fez com que a personalidade do cantor se fundisse à do personagem, emocionando a plateia em sua arietta Per l’amor del Dio vivente.
Quando um cantor – ou uma cantora – é grande em sua arte, não existem, para ele ou para ela, papeis menores. E, como comprovamos mais uma vez, não existe papel pequeno ou menos importante para Denise de Freitas. O mezzo-soprano paulista dedicou, à criação artística de Fenena, o mesmo cuidado de preparação, o mesmo carinho com que viveu, em São Paulo, Dalila na ópera de Saint-Saëns em 2008 ou Adalgisa na Norma de 2010. Foi preciso apenas a frase inicial – Nel dì della vendetta – para que quem já a conhecia se lembrasse e para quem ainda não a havia ouvido percebesse que ali estava uma das maiores intérpretes brasileiras contemporâneas. A voz, extensa e generosa, com agudos brilhantes e graves que evocam o brilho do sol sobre o ouro velho, conseguiu transformar uma ária secundária como Oh dischiuso è il firmamento – único solo do mezzo em toda a ópera – num momento elegíaco de rara beleza, destinado a ficar guardado para sempre na memória dos frequentadores do Theatro.
Como Zaccaria, o baixo goiano Sávio Sperandio obteve um dos mais importantes destaques da noite. Voz imponente, com notas graves extremas muito sonoras e agudos seguros, dispõe da flexibilidade característica de que são dotados os verdadeiros baixos cantantes. A Zaccaria corresponde o primeiro solo da ópera, Sperate o figli, com cuja interpretação, assim como a da profecia do terceiro ato, arrancou aplausos entusiasmados do público. Mas a verdadeira prova de fogo para o baixo nessa ópera é a ária do segundo ato, Tu sul labbro de’veggenti, porque seu acompanhamento orquestral é mínimo. Na maior parte do tempo, o canto dialoga com um violoncelo obbligato, o que põe a nu, deixando completamente exposta, a voz do baixo. E foi justamente aqui, na mais difícil de suas intervenções, que Sperandio brindou o público com uma verdadeira master class de canto verdiano, reafirmando sua merecida posição como maior baixo da cena lírica brasileira neste momento.
Eliane Coelho é uma artista da voz, capaz de adotar um colorido e um vibrato diferente para cada parte que interpreta. Há uma Eliane Coelho para cada papel. Sua Gioconda tinha sonoridades diferentes de sua Butterfly ou da Lady Macbeth de Mstensk que cantou, todas elas criações personalíssimas e convincentes, graças à personalidade da artista que manobra a voz da cantora. Não foi diferente nesta Abigaille.
Eliane assumiu todas as características do verdadeiro soprano drammatico d’agilità, tipo de voz em voga à época de Donizetti e do Verdi inicial, com inflexões escuras e dramáticas associadas ao virtuosismo da coloratura. Em seus poucos minutos iniciais, desde a ingrata armadilha verdiana que é aquele si grave, subterrâneo, coberto de sarcasmo que ela emitiu de forma timbradíssima na primeira frase, Prode guerrier, até a indignação com que se dirigiu a Ismaele em Io t’amava, o canto de Eliane já espalhou pela sala toda uma paleta de cores e de emoções.
Dona de técnica invejável que lhe permitiu executar figuras ornamentais como messe di voce, portamenti e pianíssimos com destreza e segurança, Eliane Coelho desincumbiu-se das intrincadas coloraturas como se nada fossem. Aliada a essa técnica, trabalharam para fazer de sua interpretação o triunfo que foi a inteligência da cantora e a sensibilidade da atriz, manobrando a voz para encontrar o colorido certo para cada cena. Na cena que abre o segundo ato, o soprano moldou sua voz ao texto de cada uma das partes, transmitindo claramente, através do canto, as diferenças implícitas entre o ciúme no recitativo, o lamento da amante abandonada na ária e a guerreira implacável na cabaletta, cada parte com uma cor específica. Memorável, também, seu dueto com Nabucco, carregado de desprezo e maldade com tal maestria a ponto de conseguir fazer com que o público não percebesse, naquele momento, como é belo e envolvente o timbre de sua voz.
E finalmente, a grande expectativa da noite, a estreia de Rodolfo Giugliani no emblemático papel do protagonista. Quando, em 2008, Giugliani cantou Giorgio Germont no Theatro São Pedro de São Paulo, várias sobrancelhas de conhecedores de ópera no público se arquearam significativamente, como a perguntar: “Será que estamos assistindo ao nascimento de um novo barítono verdiano?” A récita de sábado veio confirmar plenamente essa nova esperança dos opereiros paulistas.
Os barítonos de Verdi necessitam daquilo que os italianos chamam de pasta na voz, uma espécie de densidade carnosa, palpável, que é fundamental para a interpretação teatral através da voz pensada pelo grande compositor. Além disso, apesar da cor escura e do vibrato característico, esse tipo de voz deve dispor de agudos, pois sua tessitura é relativamente alta. Todas essas qualidades estão presentes, de forma pronta e acabada, na voz de Giugliani, que com sua emissão generosa e fiato abundante, encheu todo o espaço do teatro com suas frases escandidas e marcantes.
A forma como Rodolfo, no segundo ato, referindo-se à coroa ambicionada por Abigaille, esculpiu a frase Dal capo mio la prendi foi antológica, como antológica foi sua patética interpretação da ária Chi mi toglie il regio scettro, provocando aplausos prolongados após alternar frases aterrorizadas com a lassidão da loucura que começa a dominar o personagem. A versatilidade de Giugliani voltou a se manifestar no momento da interpretação de Dio di Giuda. Domando sua voz volumosa, dosando o fiato e produzindo um canto todo legato, Rodolfo reencontrou, em sua interpretação, a grande tradição da preghiera tão cara à ópera italiana, momento intimista em que o personagem se despe de todos os símbolos de sua importância e se prostra, humilde, diante da divindade. Esse momento de contrição deve ser expresso, como Rodolfo Giugliani fez perfeitamente, através do canto. Prevejo, em suas futuras interpretações verdianas, um futuro brilhante para a carreira deste jovem cantor.
Seria muito importante que essa produção pudesse vir a São Paulo, onde temos em funcionamento dois espaços dedicados à ópera, o Theatro Municipal e o Theatro São Pedro. Se isso vier a acontecer em uma das duas casas, espero sinceramente que o elenco seja o mesmo desta noite mágica no Rio de Janeiro. Afinal, como diria meu amigo futebolista – e como até certos presidentes o dizem – em time que está ganhando não se mexe.
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25 de julho, 2011.
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7 Comments
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Sou carioca, e apesar de viver em São Paulo há anos, me esforço para acompanhar o movimento musical e artistico de nossa cidade. Já conheço o Senhor Sergio Casoy através de seus artigos, conferências, etc. Vi-o no Theatro Municipal no dia da récita do Nabucco, à qual também assisti. Devo dizer que gostei de muitas coisas na referida produção e de outras não. Este senhor é conhecido no meio artístico como uma pessoa “elogiativa”, muito eloquente, positivista, por vezes em excesso. Tomo como exemplo disso a crítica acima escrita: será que ele realmente amou tudo e não viu uma mínima falha em nada? Chega a ser inumano o grau de “elogiação”!!! Entendo que o crítico deva fazer um apanhado geral do que viu, isento de lantejoulas e purpurinas!! Neste país, infelizmente, há uma “elite pseudo-intelectual” que pensa que o público é ignorante e que ninguém entende ou ouve!! Não digo que o Sr. Casoy pertença a este grupo, mas é enfadonho na sua trajetória pois está sempre dourando a pilula de cá e de lá!! Convenhamos que falar sempre que o céu é azul e nunca chove já encheu a paciência!! Sabendo que esta produção irá para SP, será que vamos ter que ler o mesmo lá?? Ou tudo já está predestinado a ser lindo!! Vamos confirmar lá também. Sr. Sérgio, ajude-nos a construir algo verídico e useful. Abraços do Ivan.
Meu Deus!! Não entendi nada sobre o jogo de futebol do início dessa crítica! O que isso tem a ver com ópera? Às vezes as pessoas querem ser criativas e embolam o meio de campo. Depois segue um falatório enorme sobre o Nabucco do Rio de Janeiro. Esse Nabucco, segundo amigos meus que assistiram, foi bonito, mas de acordo com esta crítica deve ter sido muito exagerado em sua perfeição absoluta! Acho que não vou assistir, pois quando a esmola é muita o santo deve sempre desconfiar. O que ocorre com isso é que o público que não assistiu vai dormir sonhando com uma ópera encenada no céu, cercada de anjinhos dourados e querubins com suas liras. Que bom… a perfeição sempre existiu, nós é que insistimos em não vê-la. Abraços aos cariocas.
Caro Ivan, supondo que cada um de nós tenha direito democrático a ter e expressar sua opinião, farei de conta que sua cartinha, dirigida a mim – às vezes denominado, num salto inesperado à terceira pessoa, como “esse senhor conhecido no meio artístico como uma pessoa elogiativa(?)” não traga, embora disfarçadamente, uma ínfima tentativa stalinista de censura. Isto posto, como não tenho o rabo preso a nenhum grupo que milita na arte ou fora dela, reservo-me o direito de, quando entusiasmado, dizer o que penso. Aliás, sou conhecido é por isso: dizer o que penso doa a quem doer, e você ficaria surpreendido com a quantidade de inimigos que tal postura tem me rendido ao longo destes quarenta anos em que frequento os espetáculos de ópera. É preciso saber, antes de tudo, ler. Como não sou crítico, em textos como esse trato de ressaltar o que me agradou e silenciar sobre o que me incomodou. Prefiro o não-aplauso à vaia. Imagino que você adore os companheiros que se prendem a minúcias e adoram dizer no teatro, em alto e bom som, coisas do tipo “o barítono entrou quatro microssegundos atrasado, o soprano calou um oitavo ou um dezesseis/avos de tom, a quarta lampada não iluminou o tenor na intensidade com que devia”, e por aí afora. Mantenho minha opinião, embora com isso corra o risco de ser avaliado por você como “enfadonho na trajetória”. Tenho uma solução perfeita, que pode ajudar a preservar seu fígado de meus escritos perturbadores: sempre que encontrar algo escrito por mim, pule meu texto! Não se sujeite a essa violência que é ler sob um céu azul repleto de pílulas douradas.
E aproveite para, munido da coragem que faltou nesse bilhete venenoso, rebater ponto a ponto tudo aquilo que o incomodou. Não gostou do soprano? Do mezzo? O baritono cantou mal? A gravação em CD que você tem em casa é muito melhor? Hoje em dia não se canta como antigamente? Assuma suas opiniões, declare-as. Ou é mais fácil mostrar-se indignado e não dizer nada porque não há nada o que dizer?
Uma última palavra deve ser dita – essa sim é uma crítica construtiva – em relação a seu texto. Espero que sinceramente, seu conhecimento de ópera seja mais profundo do que o da língua portuguesa: confesso ter percorrido todos os meus dicionários sem ter encontrado, em nenhum deles, as palavras “elogiação” e “useful”. Como vê, nem tudo está predestinado a ser lindo. Nem um texto cravejado de falsas purpurinas e lantejoulas sem brilho.
Um abraço
Sergio Casoy (que mantém, palavra a palavra tudo o que foi dito, sem tirar nem por)
Cara Elisabeth, e eu que pensei que fosse fácil entender. Leia de novo, se esforce, tenho certeza de que você conseguirá entender as metáforas escritas.
Adorei sua postura: “Se falam bem, deve ser ruim” e, a mais preciosa de todas, embora com outras palavras “Não vi e não gostei…” Brava!
Espero que você consiga nos ensinar tudo aquilo que nos falta.
Eu entendi o que o Sr. Sérgio quis dizer: que em time de futebol que está ganhando não se mexe! Mas quem sabe se tivéssemos tirado o Ronaldinho da final contra a França em 98, tivéssemos ganho a Copa! Quanto ao Nabucco, não considero o que foi escrito como uma crítica, mas sim um panegírico! Aliás, porque os críticos não gostam de ser criticados? A liberdade de expressão se aplica tanto a quem escreve quanto aos que leem. Gostei do Nabucco, mas achei a roupa do Zaccaria muito feia, em contraste com sua performance maravilhosa. Outras coisinhas também não me agradaram. Feliz é o Sr. Sérgio que consegue apreciar tudo indiscriminadamente. Espero não ter errado meu português. Aliás, para os que não sabem, useful significa útil, aproveitável.
Cara Shirley, como eu disse, não entendo nada de futebol, portanto não sou capaz de avaliar o resultado alternativo de 98, e presumo que você esteja certa. Já quanto ao panegírico – essa sim, uma bela palavra – você está coberta de razão…continuo entusiasmado. Talvez, na pressa, você não tenha lido que preferi não comentar as pequeninas coisas que me desagradaram. Nabucco é, basicamente, como tantas outras óperas daquele período, uma ÓPERA DE CANTORES. Por mais feias que fossem as roupas – e concordo com você, elas não eram bonitas – elas não tiraram, na minha visão, nada do brilho do espetáculo canoro. Fui ao Nabucco ouvir canto italiano e ouvi canto italiano de primeira qualidade.
Seu português é excelente. Useful, agora com seu significado revelado para todos os leigos, continua não sendo uma palavra da língua portuguesa. Como você mesma explica, útil ou aproveitável caberiam muito bem em seu lugar.
Assisti a Nabucco dia 31 de julho no Municipal do Rio. É a obra de Verdi de que mais gosto e pela qual mais me interesso. Desta forma, fui ao Municipal com boa disposição para assistir à récita. No todo, a apresentação foi ótima. Os atores estavam no melhor que se poderia esperar. Nada a acrescentar quanto às suas performances. A osquestra esteve no mesmo nível dos atores. Silvio Viegas estava preciso e forte no comando de seus músicos.
Meu senão, contudo, vai para alguns escorregões de postura cênica e ritmo da apresentação. Vou citar como exemplo somente dois pontos que não comprometeram, contudo, o conjunto da apresentação.
Um deles foi a abertura do terceiro ato, “E l’Assiria una regina”. Um momento de peso e emoção que inicia um novo ato foi, a meu ver, diminuído sensivelmente pelas opções realizadas na sua forma de apresentação. Em primeiro lugar, por que o trono em que Abigail está sentada se encontra colocado de lado para a plateia? Por que Abigail está sentada no trono já no início deste ato? A disposição dos seus partidários no palco também não ajudou. Estavam espalhados nas mais diversas situações. Não pareciam estar ali juntos para celebrar ou assistir à vitória de Abigail, mas dispersos e confusos, uns olhando para frente, outros para os lados, outros, ainda, para o trono. A cena perdeu a força que poderia ter.
Um outro momento em que entendo que ocorreu uma perda de sentido e força foi na famosa cena do “Va pensiero”. Não entendi para que aquela movimentação na vertical de alguns atores por aquelas estruturas colocadas pouco antes da cena quando o coral chega a seu ápice. Ficou cômico, engraçado, deslocado. A cena não pedia aquilo. Nada acrescentou! O forte ali é a própria canção, que, a meu ver, pede simplicidade de interpretação. As personagens estão tristes, lamentosas. De um momento para o outro, uns cinco ou seis elementos se destacam e começam a escalar as mencionadas estruturas. Para que? Com que fim?
A mais conhecida cena da ópera foi manchada com esta coisa quase que, digamos, patética. Fiquei estupefato com este malabarismo em um momento da ópera que pedia simplicidade.
Bem, mas como disse, valeu a pena ir domingo ao Municipal. Tomara que ela tenha apresentações em outras cidades.